Por Gilbert Di Angellis *
A pandemia do Novo Coronavírus (Covid-19) é o acontecimento mais importante do século XXI até a presente data. Trata-se de uma doença grave que está a ceifar milhões de vidas e que trouxe impactos severos à sociedade com consequências incertas a médio e longo prazos.
O contexto atual é comparado, do ponto de vista da saúde, à Gripe Espanhola e, sob à ótica econômica, à Grande Depressão de 1929. Trata-se de um cenário assombroso que assola a saúde humana, os governos, a democracia e a economia mundial.
O resumo acima poderia ser dispensável a esta altura do campeonato – início de 2021 –, mas sinto que seja importante não perder de vista a magnitude da crise que é considerada a mais grave da nossa geração e que já matou mais de 220 mil brasileiros.
Pois bem. Historicamente, crises tendem a gerar transformações relevantes na sociedade como uma reação àquilo que não mais queremos. E, nesse sentido, havia muita expectativa de que a pandemia viesse a motivar mudanças de comportamentos e de visão de mundo. No entanto, a realidade brasileira é outra: coletivamente, nada aprendemos com o maior desafio que já enfrentamos. O que se vê nas redes sociais, na imprensa e nas conversas pessoais é uma manutenção dos mesmos vícios de um mundo pré-pandemia.
A velha ostentação – comumente vista em postagens no Instagram – se soma a uma futilidade inexplicável – frequentemente localizada no TikTok – e demonstram que a maior preocupação de muitos brasileiros é ganhar curtidas, seguidores e, ao fim, admiração alheia. A vaidade das redes sociais contrasta com a dureza da vida real, onde a miséria, a fome e o desemprego se tornam cada vez mais presentes na vida de milhões de compatriotas.
No âmbito político, a polaridade esquerda versus direita ainda movimenta multidões pelo país, enquanto a nação afunda em um Titanic sem botes salva-vidas. Nem em torno da vacina e do combate à pandemia há um mínimo de união. Políticos, partidos e correligionários litigam em busca de manutenção de poder ou ambição política, deixando o bem do povo ou da nação em último plano.
Por falar em combate à pandemia, a sociedade brasileira se mostra sem qualquer responsabilidade social e insiste nos mesmos erros que nos levaram até as 220 mil mortes. Nem os dois colapsos no sistema de saúde de Manaus serviram de lição ao restante do país. Para piorar, movimentos antivacina ressurgem no Brasil ao mesmo tempo em que a xenofobia cresce de maneira assustadora.
Nesse contexto, as fakes news seguem proliferando as suas asneiras e encontrando eco em pessoas ignorantes ou mal-intencionadas, não havendo qualquer preocupação com os graves danos que estão sendo causados.
Passado quase um ano desde a chegada do vírus ao país, ainda há fortes discursos negacionistas, ataques à ciência, desrespeito aos profissionais de saúde, ira com os veículos de imprensa e politização da pandemia, tudo isso com origem ou apoio de importantes autoridades brasileiras.
Não estou a ignorar que muitos cidadãos cresceram e evoluíram com a pandemia. Além das conquistas de ordem pessoal, há belos relatos de empresas e pessoas físicas que contribuíram genuinamente para a construção de uma nação melhor para todos. Mas, infelizmente, o retrato geral da crise mostra uma sociedade incapaz de evoluir e insistente nos mesmos erros de outrora.

* Gilbert Di Angellis é especialista em Direito Empresarial. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV); especialista em Advocacia Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG); e LL.M. em Direito Empresarial pelo Ibmec. Mestrando em Direito no Centro Universitário de Brasília; membro da Comissão de Direito Empresarial da OAB/DF na gestão 2016-2018, reconduzido na gestão 2019-2021; membro da Comissão de Empreendedorismo Jurídico da OAB/DF na gestão 2019-2021; membro da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/DF (2019-2021).