Com mais de um milhão de advogados no país, é preciso muito para se destacar. Nesse sentido, ser especialista em uma área de atuação já não é mais um diferencial, mas o mínimo que se espera de um(a) profissional da advocacia.
Além da tradicional especialidade jurídica, como é o caso de profissionais dedicados ao Direito Tributário, Direito Civil ou Direito trabalhista, por exemplo, a advocacia de nicho se apresenta como uma interessante alternativa para oferecer serviços de excelência e superar a concorrência.
Muitos dos profissionais mais bem sucedidos do mercado jurídico conciliam ambas as especialidades, tanto a jurídica quanto a de nicho, tornando-se altamente qualificados e preparados para atender aos anseios de seus clientes. É o caso do Dr. Saulo Michiles, advogado especialista em Direito Empresarial com foco em startups.
As startups, enquanto empresas inovadoras com um modelo de negócios repetível e escalável, são frequentes em mercados mais sólidos e cada vez mais comuns no Brasil. Dadas algumas de suas principais características – são inovadoras, disruptivas, tecnológicas e atuam em cenário de incerteza –, é evidente a necessidade de um consultor jurídico que compreenda o seu negócio e os desafios.
Para falar sobre o tema, convidamos o Dr. Saulo Michiles. O nosso entrevistado de hoje é sócio fundador da Michiles Advocacia Empresarial, Chief Legal Officer (CLO) da Cotidiano Aceleradora de Startups, especialista em Direito de Startups, vice-presidente da Comissão de Direito Digital, Tecnologias Disruptivas e Startups da OAB-DF, LL.M. em Direito Empresarial pela FGV/RJ, professor de Lawtechs na Pós-Graduação de Negócios Disruptivos do IESB, professor de Direito de Startups na ESA OAB/DF e economista.
Esta é mais uma entrevista exclusiva de uma série especial intitulada “SUCESSO NA ADVOCACIA”, onde conversamos com renomados(as) profissionais – todos(as) especialistas em suas áreas de atuação e com êxito em suas carreiras – sobre os desafios e oportunidades de cada seara jurídica, com o objetivo de extrair lições e dicas práticas para você, nosso(a) querido(a) leitor(a), que busca o seu lugar ao sol. Para ter acesso às demais entrevistas, clique aqui.
VIVER DIREITO – O que é uma startup? Quais são as legislações de regência em matéria de startups?
Dr. Saulo Michiles – Não existe uma definição única sobre o que é uma startup, grandes nomes do ecossistema divergem quanto um ou outro requisito. Minha definição é que startups são organizações que buscam transformar a vida das pessoas, se utilizando de tecnologia, de uma maneira inovadora e escalável. Atualmente temos a Lei Complementar 155/16, que trata de um tipo de contrato para Investidores Anjos e a Lei Complementar 167/19, que institui o Inova Simples, um tratamento diferenciado para startups. Esta última, inclusive, traz uma definição do que são startups:
“§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se startup a empresa de caráter inovador que visa a aperfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de produção, de serviços ou de produtos, os quais, quando já existentes, caracterizam startups de natureza incremental, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente novo, caracterizam startups de natureza disruptiva.
§ 2º As startups caracterizam-se por desenvolver suas inovações em condições de incerteza que requerem experimentos e validações constantes, inclusive mediante comercialização experimental provisória, antes de procederem à comercialização plena e à obtenção de receita.”
Além disso, temos a proposta de Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador, o PLP 146/19, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e aguarda aprovação pelo Senado.
Quais são os principais serviços jurídicos prestados a esse segmento de cliente?
A assessoria jurídica envolve as questões tradicionais que todas as empresas demandam normalmente, mas vai além, com a utilização de institutos jurídicos até então desconhecidos para a gigantesca maioria das empresas. Entre eles estão os contratos de investimento, como o mútuo conversível em participação societária. Também é muito utilizado o instituto do “vesting”, seja quando da formação da sociedade, para que os fundadores se obriguem a se dedicar àquela empresa, bem como para a atração e retenção de talentos, quando é utilizado para outorgar uma participação societária a um colaborador, mediante o cumprimento de certas condições e de maneira proporcional ao longo do tempo.
Outros contratos muito utilizados são o Termo de Confidencialidade, o Memorando de Entendimentos, o “Term Sheet” ou Carta de Intenções de Investimentos, o contrato ou plano de “Stock Options”, bem como os Termos de Uso e Política de Privacidade.
No que um(a) advogado(a) de startup se diferencia de um(a) advogado(a) tradicional?
Em um aspecto mais concreto, a atuação para startups tende a ser eminentemente consultiva, com pouca atuação no contencioso. Já sob um olhar mais sutil, a atitude, a mentalidade e o conjunto de conhecimentos de um advogado de startups devem ser bem diferentes do que se entende por um advogado tradicional.
Características como formalismo, linguajar rebuscado, inflexibilidade e lentidão não têm vez na atuação para startups. Como se trata de um ecossistema extremamente dinâmico, informal, de conhecimento transversal e profundo, o advogado deve se adequar a esse ambiente. As mudanças vão desde a vestimenta e a forma de falar, até a necessidade de um conhecimento maior não só no Direito, mas em outras áreas do conhecimento.
Qual é o perfil ideal de um(a) profissional de sucesso nesse segmento jurídico especializado?
É claro que não existe um só perfil, estamos tratando do meu entendimento do que seria um perfil ideal. Além das características e conhecimentos que eu já mencionei na pergunta anterior, outro aspecto bastante importante de ser ressaltado são as chamadas “soft skills”, habilidades que, ao contrário do conhecimento intelectual, normalmente exigido de qualquer profissional, vêm sendo cada vez mais exigidas nas empresas de tecnologia e ambientes de inovação. Algumas delas são: inteligência emocional, habilidade de relacionamento com pessoas, boa comunicação e capacidade de resolver problemas. Aliando tudo isso, eu creio que o perfil ideal desse profissional deve ser o de uma pessoa empreendedora, que gosta de inovar, inclusive em sua carreira, que tem conhecimentos transversais em diversas áreas e profundo no direito e que ama a tecnologia e o mundo empresarial.
Além do conhecimento jurídico específico para o exercício da advocacia, um(a) advogado(a) especializado em startup deve dominar que outras áreas de conhecimento?
A primeira coisa que chama atenção são os termos utilizados, quase todos em inglês, inclusive no que diz respeito ao Direito de Startups. Então, o conhecimento dessa língua é bastante desejável. Além disso, é importante conhecer de negócios, de gestão e entender mais sobre o que as startups/clientes estão se propondo a fazer. É preciso ter uma noção sobre gestão de empresas, marketing e empreendedorismo. Por fim, conhecimento sobre tecnologia e até, se for o caso, sobre programação, será bastante útil.