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Gestão, marketing e empreendedorismo na advocacia: entrevista com o Prof. Wagner Osti

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A advocacia é uma carreira complexa. Diversas são as habilidades e competências essenciais para a prestação de um serviço jurídico de excelência e para a manutenção de um negócio rentável. Nesse sentido, temas como gestão, marketing jurídico e empreendedorismo são fundamentais aos profissionais que almejam o sucesso.

Para falar sobre esses e outros assuntos, com uma abordagem prática de quem conhece o assunto, convidamos o professor, advogado, autor e consultor Wagner Osti. O nosso entrevistado é mestre na linha de Direito dos Negócios pela Escola de Direito de São Paulo da FGV, especialista em Contratos Internacionais do Comércio pela University of California-EUA (LL.M) e especialista em Direito, Logística e Negócios Internacionais pela PUC-Curitiba. Possui larga experiência em escritórios de advocacia de grande porte e em jurídico interno de empresas multinacionais líderes de mercado. Pela FGV, ministra a disciplina de gestão estratégica de serviços jurídicos no programa de LL.M empresarial e a disciplina de Compliance no programa de MBA Executivo em Finanças. É autor de livros sobre responsabilidade civil, gestão estratégica e compliance. Também é consultor de planejamento estratégico para advogados e sócio da empresa WO Gestão Jurídica.

VIVER DIREITO ­– Cada vez mais a advocacia debate temas como gestão, marketing e empreendedorismo. Mas, afinal, qual é a verdadeira importância desses assuntos para a construção de uma advocacia de sucesso?

Prof. Wagner Osti – A importância desse tema é relacionada à sustentabilidade lucrativa dos nossos serviços jurídicos. Vou explicar melhor. Nossa advocacia é feita por nós, pessoas que acordamos cedo diariamente e batalhamos para conquistar nosso merecido espaço. Uma advocacia difícil, porém, compensatória se pensada e exercida de forma estratégica e de acordo com as normas vigentes. E é nesse ponto que se insere a proposta da multidisciplinaridade da gestão, marketing e empreendedorismo: ajudar você, nobre colega advogado(a), a ter mais sucesso em sua advocacia, agregando mais valor ao que você faz todos os dias. Lembre-se-que que seu cliente de hoje já não quer uma advocacia de ontem.

A resposta parece filosófica e subjetiva, mas não é. Sem esses co­nhecimentos — que, compilados, chamaremos de multidisciplinares —, você não terá sucesso na advocacia e, mui­to em breve, pode se frustrar a ponto de trocar de profissão.

Por exemplo, quantos de nós já não tivemos a sensação ruim de trabalhar cada vez mais e, no final do mês ou ano, receber a mesma coisa em nossa conta bancária? Ou, quem nunca olhou no espelho e se perguntou: “Por que não me pagam quanto eu mereço?” Gostaríamos que essas sensações fossem raridade, mas, infeliz­mente, não é isso que eu escuto nas minhas consultorias e em salas de aula.

Em face dessa complexidade sem fronteiras e do relativismo das relações comerciais e interpessoais, os clientes buscam soluções rápidas e eficazes, com uma pitada de risco para incrementar a lucratividade das operações. Advo­gados apaixonados por uma advocacia romântica, burocrática e legalista já não têm muito espaço para seguir adiante com novos clientes-chave, princi­palmente aqueles que têm vínculos internacionais ou DNA de startup. Uma recomendação legal apenas baseada na lei ou um posicionamento pessimista em que “nada pode” já são coisas do passado para aqueles que almejam ter sucesso na carreira jurídica.  Por isso, quanto mais os doutores das leis se aproximarem das disciplinas dos curso de administração, economia e contabilidade, melhor.

VIVER DIREITO ­– A gestão de um escritório de advocacia é, por si só, um mundo próprio repleto de complexidades e desafios. Na sua experiência prática, quais são os principais “pecados” quando o assunto é gestão? Quais são as grandes lições que as principais bancas do país oferecem ao restante da advocacia?

Prof. Wagner Osti – Nas minhas visitas a dezenas de bancas em praticamente em todas as capitais do país, penso que os maiores pecados, desafios são:

  • Atividades improdutivas: O fato inconteste é que nunca estivemos tão expostos a dispositivos tecnológicos que tiram nosso tempo e isso pode ser uma armadilha silenciosa. Essas armadilhas do tempo são fomen­tadas principalmente pelas redes sociais e pelos aplicativos de mensagens ins­tantâneas. Isso deflagra o mesmo comportamento de milhares de anos atrás: deixamos o planejado de lado, procrastinamos nossas decisões para lidar com algo que acabou de aparecer diante de nossos olhos.  Acreditem ou não, esse é o maior problema dos escritórios que têm dificuldade de faturar mais: o desper­dício de tempo com coisas fúteis, sem valor agregado, por parte dos advogados “cibernéticos”.
  • Mindset fixo: Há dois tipos de mentalidades. Um deles é a mentalidade fixa, de acordo com a qual o indivíduo acredita que se não nascer com determinadas capacidades e dons naturais, não pode desenvolvê-los ao longo do tempo. Do outro lado, há pessoas com uma mentalidade progressiva ou de crescimento. Estas, por sua vez, acreditam que seus talentos e habilidades podem ser desenvolvidos, desde que elas sejam pacientes, focadas, esforçadas e dedicadas. Algumas pessoas têm um talento inato para liderar, isso é fato. Outras aprendem, mas só quando querem. Os advogados com mindset progressivo estão destinados ao caminho do sucesso, pois buscam vencer suas limitações e aprimorar seus conhecimentos diariamente, importando-se com a qualidade de vida das pessoas ao seu redor.
  • Muitos chefes e poucos líderes: Não sabemos sobre o seu perfil comportamental e ambiente de trabalho, mas sabemos que suas posturas influenciam diretamente no de­sempenho e na produtividade da equipe, principalmente quando conside­ramos o mercado da advocacia. As habilidades de motivar e influenciar pessoas são exemplos de características necessárias em um líder-advoga­do. Alguns profissionais conseguem ser chefes; porém, para ser um líder a ser seguido, reconhecer a lacuna do conhecimento é o primeiro passo. Ao sair da faculdade, após cinco anos, e passar um tempo estudan­do para o exame da OAB, deparamos com um mercado extremamente com­petitivo, no qual, para se firmar na profissão, é necessário muito mais que co­nhecer o vade-mécum.
  • Precificação de honorários sem técnica: Adiantamos com toda a sinceridade que precificar a advocacia não é simples. Estamos lidando com uma prestação de serviço intangível de difícil mensuração, em que a pessoalidade e confiança influenciam demasiadamente no valor final, além de o cliente só saber se gostou do que contratou no momento em que algo já foi protocolado ou quando da execução. Acontece que, com a concorrência acirrada dos dias hodiernos, mister se faz incluir no seu planejamento estratégico uma lógica para calcular seus honorários, sempre alinhada à filosofia e aos objetivos da banca ou do departamento jurídico de uma empresa.  Nesse contexto, um modelo de decisão de preço baseado em uma meto­dologia é altamente necessário para a consecução dos objetivos do seu negó­cio, visto que decisões de preço equivocadas comprometem os resultados e, consequentemente, a continuidade da advocacia.
  • Marketing errado: Com um marketing jurídico estratégico (focado nas relações digitais), as sociedades agregarão maior valor à marca, com reais possibilida­des de captação e retenção de clientes. Como bem sabemos, seu cliente não contratou apenas um advogado para representá-lo, mas uma marca que tem história e provavelmente traz confiança. Baseando-se na pessoalidade do pro­fissional e da mensagem que a marca passa aos clientes, estes julgarão a pres­tação de serviços jurídicos como ruim, mediana, boa, ótima ou excepcional. Para ir além das conquistas de novos clientes, um marketing estratégico busca pela apologia, por apóstolos de sua marca. O planejamento estratégico deve comtemplar um estudo criterioso antes de se iniciar o marketing jurídico propriamente dito, pois, afinal de contas, conquistar clientes é uma técnica não trivial e essencial para a atividade. Em sua graduação, você deve ter escutado inúmeras vezes que a disciplina de di­reito civil, penal ou trabalhista era a mais importante. Pois nós colocamos o marketing jurídico no mesmo patamar de igualdade. Marketing é ciência, estratégia, não podendo ser enquadrado simplesmente como publicidade. E, por último, por favor, não ache que alguns posts de Instagram ou LinkedIn é marketing estratégico. Este é muito mais detalhado e focado do que algumas simples imagens jogadas nas redes sociais, sem muito valor intelectual por trás.

VIVER DIREITO ­– Na hora de apostar em um software jurídico, quais são os principais critérios que devem ser considerados?

Prof. Wagner Osti – Por falar em sistemas, as perguntas mais corriqueiras que escutamos em palestras são: “Qual o melhor software para meu escritório?”; e “Qual o melhor custo-benefício na compra de um software para meu departamento jurídico?” Se há perguntas difíceis de responder, aí estão elas. Entretanto, posso recomendar que antes de comprar um sistema, analise os seguintes pontos:

  • Indicadores (KPIs) inteligentes: O advogado moderno precisa ter sob seu comando o maior número possível de dados, números e estatísticas para recomendar uma determinada ação ao seu cliente ou, em jurídico interno de empresas, tomar uma decisão estratégica inteligente em favor do negócio. Toda empresa que deseja crescer precisa buscar métodos de gestão eficientes e que auxiliem na redução de custos, na melhora nos investimentos e no ganho de vantagem competitiva. Nesse cenário, os KPIs desenvolvem papel ativo, pois, com os resultados obtidos e compreendidos, amplia-se a visibilidade dos pontos posi­tivos e negativos da advocacia.
  • Valor da assinatura mensal e custo de implementação: de nada adianta um software super bem desenvolvido se o valor é mais alto do que a lucratividade de alguns cliente. Ou seja, o custo não pode ser caro o suficiente para deixar a administração do escritório preocupada, aflita. Há uma década os softwares despediam de um investimento considerável. Hoje, as coisas mudaram e eu tenho a certeza de que se você procurar com calma, achará um software no mercado se se adeque a sua necessidade e a dos seus clientes.
  • Possibilidade de customização: sabe qual o melhor software jurídico do mundo? Aquele que seu cliente consegue customizar para lhe atender de forma única. Se o software que você contratou não permite fazer modificações, sugiro olhar as alternativas disponíveis. Seu cliente quer um atendimento diferenciado e nada melhor do que que começar por um sistema customizável e responsivo. Muito oferecerem soluções mirabolantes em segundos, mas poucos conseguem concretizar tais soluções em dias.
  • Suporte ao cliente: E se o sistema parar de funcionar e seu cliente lhe pedir um relatório de urgência? Um bom sistema tem suporte aos clientes 24 horas por dia, com um tempo de reposta eficiente. Antes de contratar, pergunte quem vai atender o telefone e em quanto tempo eles demorarão para lhe entregar uma resposta.

VIVER DIREITO ­– Qual é a importância da mentoria e do coaching para advogados?

Prof. Wagner Osti – Um advogado com inteligência emocional apurada, consegue entender e se relacionar de forma racional com os próprios desafios e conflitos. Alguns ajustes finos de gestão emocional e comportamental, administração de tempo e prioridades, definição clara de objetivos são etapas simples de se cumprir com orientação profissional, mas aptas a alavancar seus resultados significativamente. Além disso, percebemos que muitos advogados necessitam ressignificar suas dores, tanto do passado quanto do atual momento, e crenças limitantes que geram obstáculos para o desenvolvimento do processo evolutivo profissional.

VIVER DIREITO ­– O que seria planejamento estratégico para advogados? Qual é a sua relevância?

Prof. Wagner Osti – Diante de muitas definições teóricas, optamos pelo entendimento de que o planejamento estratégico para advogados é o caminho escolhido para posicionar o jurídico interno ou o escritório de advocacia de forma competitiva no mercado de trabalho, garantindo sua continuidade a longo prazo.

Definir uma estratégia na advocacia é importante porque ela funcionará como um guia. Ela mostra a posição atual e permite traçar a melhor trajetória para se che­gar a uma outra determinada posição. Através da estratégia, pode-se saber aonde queremos chegar e qual o caminho para alcançar esse lugar tão almejado. O planejamento estratégico, independentemente da área do conheci­mento, é uma atividade que nos auxilia na antecipação de problemas, de ma­neira que as ações sejam implementadas para atingir os objetivos previamente traçados, alinhados e comunicados a todos que trabalham ao nosso redor. In­felizmente, percebemos que, na prática, isso ainda é visto (pelos desavisados) como uma tarefa enfadonha, complexa, sem razão de ser, além de custosa.

Por tudo que foi até aqui exposto, concluímos que os advogados que se capacitarem a pensar estrategicamente terão uma enorme vantagem competi­tiva em médio e longo prazo. Percebemos que, com a inclusão de um planeja­mento estratégico na rotina da sua banca de advogados ou no jurídico interno de empresas, todos (pessoas físicas e jurídicas) ganharão em sustentabilidade, longevidade, lucratividade e qualidade técnica.

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